Prólogo
Saiu recentemente em italiano um interessante livro do rabino Jacob Neusner [1], que volta a 1991 (Jews and Cristians. The Myth of a Commun Tradition) com respeito à relação entre judaísmo e cristianismo. É decididamente um livro contra a corrente, porque sustenta e – estou certo – prova que “entre judaísmo e cristianismo […] não existe e nunca jamais existiu um diálogo. O conceito de uma tradição judaico-cristã […] é somente um mito, no pior sentido: uma mentira” [2].
• Segundo o Autor, as duas religiões “não compartilham temas comuns” e, “se a Escritura pode fornecer uma base comum, conduziu apenas à divisão, porque o Antigo Testamento serve ao cristianismo somente enquanto prefiguração do Novo, e a Torá escrita para o judaísmo pode e deve ser lida somente na óptica de cumprimento e completamento total da Torá oral [Cabala e Talmud colocados só em um segundo tempo por escrito, ndr]” [3]. Na verdade, “os cristãos comumente supõem que o judaísmo seja a religião do Antigo Testamento, mas isto é verdadeiro só em parte, e portanto completamente falso. [...] O cristianismo faz apelo ao Antigo Testamento, em dialética com o Novo, como parte da Bíblia; o judaísmo lembra a Torá escrita em dialética com aquela oral [Cabala e Talmud]” [4].
• Ele define a relação entre as duas religiões como de “gentes diversas [rabinos e bispos] que dizem coisas diversas [Israel e Cristo] para gentes diversas [judeus e cristãos]”[5]. E conclui: ”Ora, não existe, nem jamais existiu, uma tradição judaico-cristã” [6]. Na verdade, o cristianismo se ocupa da salvação, que diz respeito à humanidade inteira, enquanto o judaísmo se ocupa da santificação da nação de Israel [7]. Neusner, com muita honestidade intelectual e clareza, fala de “autonomia do cristianismo e da sua unicidade absoluta” [8]. Desfeita a teoria segundo a qual o cristianismo seria um judaísmo reformado, decorre analogamente a relação entre protestantismo e catolicismo: ”O nosso século foi testemunha de um erro teológico fundamental […]. Falando abertamente, trata-se, ademais, de um erro protestante. O erro teológico foi o de apresentar o cristianismo como uma reforma histórica, uma continuação do judaísmo” [9]. Tal erro é imputável não só ao protestantismo, mas também à exegese modernizante e modernista do século XX, e a sua consequência foi deletéria para a doutrina católica. Na verdade, estando assim as coisas, “os cristãos [...] se encontram em uma posição subordinada [...], tornando-se não o verdadeiro Israel [...], mas simplesmente um Israel por defeito, isto é, por defeito do velho Israel” [10]. Em suma, uma espécie de irmãos menores e deficientes. A teologia cristã judaizante, de origem luterana, apresentava o novo protestantismo como um velho catolicismo reformado, e o verdadeiro cristianismo de origem como um velho judaísmo reformado. Por isso, a nova teologia modernista e neomodernista, canonizada por Nostra Aetate, recuperando o erro exegético–teológico luterano, apresenta “a vida de Jesus em linha com o judaísmo do seu tempo, e a salvação de Cristo como um evento interno ao judaísmo do século I” [11]. Daí, para compreender o Evangelho, tem-se afirmado, ser necessário interrogar o Talmud e os rabinos [12]; enquanto a doutrina tradicional dos Padres e do Magistério constante da Igreja ensinava que “no” Antigo Testamento está escondido o Novo e no Novo Testamento aparece claro e significado o Antigo (S. Agostinho, Quaest., in Hept., II, 73).
• O Autor explica que o ambiente católico foi contaminado por tal tendência depois da tragédia da Segunda Guerra Mundial em razão de certa avaliação feita pelo nacional-socialismo “sobre a herança judaica da Igreja e do cristianismo [...], levando em conta a tragédia do cristianismo na civilização da Europa cristã, pervertida pelo nazismo. [...] Todos estavam animados de boas intenções [...]. Mas o resultado é uma leitura não cristã do Novo Testamento” [13]. Donde, em outro lugar, aprofundar o problema do condicionamento psicológico súbito do ambiente católico depois da segunda grande guerra e especialmente depois da shoah, que levou a uma leitura do Novo Testamento de forma não cristã, mas judaizante [14]. Na verdade, se se abstraem estas premissas histórico-teológicas, não se pode compreender aquilo que ocorreu no Vaticano II e no pós-concílio. O fato, et contra factum non valet argumentum, é que a leitura ou hermenêutica modernizante, como a luterana, do Novo Testamento “não é cristã”. Enquanto “apela às fontes judaicas, [...] tal hermenêutica deriva da teologia de um cristianismo como continuação e puro melhoramento do judaísmo” [15]. Em vez disso, o cristianismo é algo único, absoluto, autônomo, e de modo algum uma reforma do hebraísmo.
• O Autor rejeita totalmente a doutrina segundo a qual “Jesus era judeu e, portanto, para compreender o cristianismo, os cristãos deveriam chegar a um acordo com o cristianismo” [16]. O verdadeiro cristianismo é aquele que “pode tomar a si mesmo como o tomavam os Padres da Igreja, como novo e não contingente, [...] não como subordinado ao judaísmo. Judaísmo e cristianismo são religiões em tudo diferentes e com pouco em comum” [17]. Para o cristianismo Deus é uno na sua natureza, mas trino nas Pessoas, e Jesus é Deus encarnado no seio da SS Virgem Maria; enquanto o judaísmo não aceitou tal Evangelho ou Boa Nova trazida por Cristo e seus Apóstolos e continua a negar a SS. Trindade e a divindade de Cristo, fundando-se sobre a santidade de Israel como família carnal descendente geneticamente de Abraão. Neusner diz que, se o cristianismo é único, também o judaísmo se acredita tal, donde concluir pela inutilidade do diálogo entre as duas religiões, diametralmente opostas, ainda que fundadas – em parte – sobre uma base semi-comum: o Antigo Testamento, que, porém, é lido pelo judaísmo à luz do Talmud, considerado mais importante que a Torá [18], enquanto pelo cristianismo é estudado à luz do Novo Testamento. Em razão disso, “não podemos referir a Bíblia quando falamos de judaísmo” [19]. O rabino americano não esconde que “o cristianismo não é tal porque melhorou o judaísmo […]. Mas porque constitui um sistema religioso, autônomo, absoluto e único. […], judaísmo e cristianismo são duas religiões em tudo diversas” [20]. Viva a face da sinceridade e abaixo a mentira do ecumenismo judaico-cristão, que é a “quadratura do círculo” ou a “coincidentia oppositorum” feita “Congregação Permanente”.
• O problema central, segundo Neusner, não é o das “raízes comuns”, de que falaremos a respeito, mas o da divindade de Jesus Cristo. Na verdade, pergunta-se honestamente o rabino, “Jesus é o Cristo? Se é assim, então o judaísmo cai. Se não é assim, então o cristianismo erra” [21]. Ele cita Eusébio de Cesaréia (tr. it. História Eclesiástica, Milão, Rusconi, 1979) e São João Crisóstomo (tr. it. Homilia contra os judeus, Verrua Savóia, CLS, 1997), o qual falava de “regressão cristã ao judaísmo” acerca daqueles cristãos que frequentavam ainda a sinagoga e os cultos judeus em Antioquia em 386-387, um “retorno à infidelidade judaico-talmúdica”. A mesma acusação feita no século IV por Crisóstomo aos judaizantes de Antioquia se pode fazer hoje aos judaizantes do Vaticano II (Nostra Aetate, 1965) e do pós-concílio (Oração da sexta-feira Santa, do Novus Ordo Missae de Paulo VI, 1970; A antiga aliança jamais revogada de João Paulo II em Mainz em 1981; os judeus nossos irmãos maiores e prediletos na fé de Abraão, João Paulo II em 1986; e até ao Discurso à sinagoga de Roma, de Bento XVI, 17 de janeiro de 2010). Tertium non datur: se Cristo é Deus, o judaísmo cai; se não é Deus, erramos nós cristãos por dois mil anos, devemos reconhecê-lo publicamente, pedir perdão a Deus e aos homens e enfim formar “prosélitos da porta” ou “noachidi” (v. Elia Benamozegh e Aimé Pallière). O diálogo judaico-cristão é inútil, daninho, injurioso, falso e mentiroso. O mesmo diz ainda o rabino Jacob Neusner. Ele concorda com Crisóstomo só quanto ao fato de que o judeu-cristianismo ou o judaizar-se, para os cristãos, é um “ato de apostasia, incredulidade e recusa de Deus [Cristo]” [22]. Crisóstomo temia, justamente, que os cristãos de Antioquia se mostrassem “rendidos de respeito ao judaísmo” [23]. A mesma apreensão, et multo magis, a demonstra Neusner em relação ao diálogo judaico-cristão, no qual a religião cristã já não se considera aquilo que é, mas uma pseudorreforma proto-luterana do judaísmo. À doutrina cristã tradicional segundo a qual Cristo é Deus e previu em 33 a destruição de Jerusalém e de seu Templo, o que sucedeu em 70, o judaísmo respondia no século IV, pela boca de seus sábios ou rabinos, que Roma tornada cristã no século IV é o penúltimo Império depois da Babilônia, da Medo-Pérsia, da Grécia e será seguido do de Israel, o último e definitivo, como família genética de Abraão, que dará morte à Roma primeiro pagã e depois cristã, sendo “o caráter de Roma principalmente cristão” [24]: “Os sábios [ou rabinos] afirmam que Israel segundo a carne [...] permanece em estado incondicionado e perene. Não deixa nunca de ser filho [físico], e filho dos próprios genitores. Assim, Israel segundo a carne constitui a família, na sua forma mais física, de Abraão, Isaac e Jacó [...]; a total e completa “‘geneaoligizzazione’” de Israel” [25], como se vê, é uma questão genética ou de estirpe, que fala de “raça”, estirpe, sangue e somente do judaísmo rabínico, e não – como seriam os “antissemitas” – o cristianismo. Portanto, mostra-se quão tola é a acusação de antissemitismo feita à Igreja por eméritos trombones, impelida por algumas estúpidas e soi-disant raposas.
• “Israel provocará a queda de Roma [ex-pagã e depois, com Constantino, cristã, 313]” [26]. Portanto, para os rabinos, Israel não está terminado, mas suplantará Roma e o cristianismo. Segundo o Autor, a queda de Jerusalém foi causada pela arrogância dos judeus zelotes do século I, os quais, especialmente com Bar Kochba, se recusaram a entregar-se à providência divina e quiseram edificar um Reino de Israel com suas forças naturais e político-militares. Tal arrogância provocou da parte divina o abandono de Israel nas mãos de Roma, que de pagã se tornou depois cristã, e no século IV pareceu que o cristianismo romano houvesse triunfado sobre o judaísmo [27]. Mas a apocalíptica judaica [28], voltando ao fim dos últimos tempos, cobrou a restauração do reino de Israel e tentou derrubar tal “teologia da história” cristã. Ora, a mesma situação foi criada com o nascimento do Estado de Israel, que é obra da política e das armas e não do Messias judaico, e por isso também para os rabinos ortodoxos hodiernos o sionismo representa uma ameaça a Israel, como aconteceu em 70. Pois bem, este tema merece ser aprofundado em um próximo artigo.
• Também a consideração que Neusner faz sobre o islamismo, em um tempo de arabefobia e das raízes européias judaico-cristãs e anti-islâmicas, são interessantes, profundas e corajosas. Na verdade, ele escreve: “Como sabemos [apesar do aparente triunfo do cristianismo, com os imperadores romano-cristãos, a partir de Constantino e Teodósio] que venceu o judaísmo dos sábios [ou rabínico-talmúdico]? Porque quando, à sua volta, vence o islã [VII-VIII século] o cristianismo se retira do Oriente Médio e do Norte da África. Sem dúvida o cristianismo resistiu, mas não como a religião majoritária do Oriente-Médio romano e do Norte da África [...]. Mas o caráter islâmico do vizinho do Oriente-Médio e do Norte da África nos conta a história do que aconteceu realmente: uma derrota para o cristianismo [...]. A cruz reinou apenas nos lugares aonde não foi o Islã e o seu poderio militar” [29]. Portanto, o atual “conflito de civilização”, querido pelos EUA e por Israel, é um choque com o “mundo árabe”, enquanto ainda não está liberto e iluminado pela modernidade ocidental, e de modo algum um distanciar-se do islamismo, que em si é visto com simpatia, enquanto sepultamento do cristianismo tradicional e não judaizante.
Conclusão
Tal leitura deve dar-nos de volta, em um tempo para nós tão triste, o orgulho de sermos totalmente e integralmente cristãos ou católicos romanos. As raízes judaico-cristã/romanas são uma mentira. Pode-se, ao contrário, falar de raízes comuns judaico-calvinistas ou EUA/israelenses. O judaísmo é completado pelo Talmud, enquanto o cristianismo romano o é pelo Novo Testamento, tal como compreenderam os Padres da Igreja e o sistematizou a Escolástica. O judaísmo não é a Bíblia, mas o talmudismo rabínico. Atualmente, com o Vaticano II assistimos a uma tentativa de protestantização da Igreja, que com a “colegialidade” realizou o próprio ódio luterano ao primado do Papa; com a “liberdade religiosa” o ódio à única verdadeira religião, fundada por Deus Filho; com o “ecumenismo” o ódio por intolerância doutrinal à Igreja Romana; e enfim com a pseudo-“reforma litúrgica”, feita junto com os calvinistas, se produziu um rito objetivamente [30] híbrido ou uma interseção bastarda (o Novus Ordo Missae de Paulo VI) entre dois ritos essencialmente diversos, o protestante e o católico. Tal protestantização é o fim próximo; o remoto é a judaização. Na verdade, a hermenêutica luterana leva a uma leitura não-cristã e filo-judaizante da Torá. Portanto, longe de ceder ao diálogo, em posição de inferioridade ou de “minoria deficiente” com relação aos “irmãos mais velhos”, devemos reivindicar o valor absoluto, único e autônomo do cristianismo petrino ou romano. Uma vez que Cristo é Deus e o provou com a sua Ressurreição, o diálogo inter-religioso judaico-cristão é uma “regressão ao talmudismo”, “uma apostasia ou incredulidade”, enquanto recusa implícita a Deus Filho e pois a Deus Pai e Espírito Santo.
• Infelizmente, tal diálogo é conduzido, depois de João Paulo II, também por Bento XVI, que no seu livro Muitas religiões e uma única Aliança: a relação judaico-cristã. O diálogo das religiões (Cinisello Balsamo, San Paolo, [1998], tr. it., 2007) escreve que: “Depois de Auschwitz, a tarefa de reconciliação e de acolhimento se representou diante de nós em toda a sua imprescindível necessidade” [31]. Depois – citando Jo. IV, 22, “a salvação vem dos judeus”, pronunciada por Jesus antes da sua Morte na cruz –, afirma, a respeito da Antiga Aliança, que “tal origem mantém vivo o seu valor no presente [depois da morte de Cristo, na Nova e Eterna Aliança]” [32]. Todavia, “não se pode ter acesso a Jesus [...] sem a aceitação do Novo Testamento” [33]. Donde para os judeus a salvação vir de Israel e do Talmud, enquanto para os gentios convertidos ao cristianismo vem de Cristo e do Novo Testamento. A Antiga Aliança, também segundo Bento XVI, jamais cessou (cf. João Paulo II,A Antiga Aliança jamais revogada, Mainz, 1981), na medida em que “‘Aliança’ significa apenas vontade divina e não um contrato bipartido” [34]. Donde, também se Israel foi infiel a Deus, Deus não poder dividir a Aliança, porque não é “um acordo recíproco” [35], para o qual Deus non deserit etiam si prius deseratur. É triste, mas para conhecer a doutrina católica sobre a relação entre cristianismo e judaísmo é preciso ir ao “catecismo” do rabino Jacob Neusner; enquanto para judaizar basta escutar as “midrash” de Bento XVI. Que estranha época esta: o judeu ensina o catecismo, apesar de não crer nele, enquanto o padre católico diz as “midrash”, e talvez até creia, ou pelo menos finja crer.
• Enfim, o ódio comum a Roma que caracteriza o judaísmo e o luteranismo é indicativo. A alternativa, portanto, é ou Roma ou a morte! Se cai (por absurdo) Roma, triunfam Tel Aviv e Nova York. O estado atual de embrutecimento da humanidade é fruto do domínio judaico-americanista do mundo. A salvação e a restauração do homem, da família e da sociedade será fruto milagroso do triunfo da Roma “imortal dos Mártires e dos Santos”! Nossa Senhora em Fátima prometeu: ”Por fim o Meu Coração Imaculado triunfará”. Cor Jesu adveniat regnum tuum, adveniat per Mariam.
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NOTAS
[1] Nasceu nos EUA em 1932. Professor de história e teologia do judaísmo no Bard College de Nova Iorque, e ordenado rabino no Jewish Theological Seminary”, é considerado o maior especialista vivo da leitura rabínica antiga. Muito interessante sua Disputa imaginária entre um rabino e Jesus. Que mestre seguir? [1993], tr. it. Casale Monferrato, Piemme, 1996; 2a. ed. Um rabino fala com Jesus, Cinisello Balsamo, San Paolo, 2007.
[2] J. Neusner, Judeus e cristãos. O mito de uma tradição comum, [1991], tr. it. Cinisello Balsamo, San Paolo, 2009, pg 7
[4] Ibidem, pp. 159-160.
[5] Ibidem, p. 9.
[6] Idem.
[7] Ibidem, p. 17.
[8] Ibidem, p. 31.
[9] Ibidem, p. 32.
[10] Ibidem, p. 33.
[11] Ibidem, p. 34.
[12] Idem.
[13] Idem.
[14] Os fatos de Auschwitz tornaram crônico um problema grave e impeliram a uma ação semelhante ao martírio, da parte dos intelectuais religiosos judeus e cristãos, para enfrentar aquele desafio [...]: “dar um sentido ao outro” (J. Neusner, cit., p. 158). Vale dizer que, apesar da diferença total entre judaísmo e cristianismo, você vai compreender “totalmente o outro a partir de si” (o cristão/o judeu e vice-versa) só a partir de Auschwitz ou da teologia da “shoah”. Donde, também da parte cristã, não se poder prescindir de enfrentar o fato, tornado hoje meta-histórico, da perseguição que sofreram muitos judeus na Europa entre 1942 e 1945. Tal estudo é conduzido seja historicamente (fonte histórica, documentos, fatos aclarados e testemunhos dos livros de história da Europa entre 1940 e 1945); seja cientificamente (meios de pesquisa e experimentos químicos-físicos e engenharia sobre as armas de crime: as câmeras de gás e os fornos crematórios e o corpo de delito: o que resulta realmente e objetivamente no lugar da perseguição); seja filosoficamente (mal absoluto/relativo); seja enfim teologicamente (“holocausto” de uma parte do judaísmo europeu ou o Holocausto redentor de Jesus Cristo). Não se pode voltar atrás, sob pena de ser chantageado e posto em situação de acusação com respeito a um fato que não se vai estudar para ver qual é a sua real entidade. Si non vis errare, debis velle scrutare.
[15] Ibidem, p. 35.
[16] Ibidem, p. 160.
[17] Ibidem, pp. 162-163.
[18] Ibidem, p. 176.
[19] Ibidem, p. 197.
[20] Ibidem, pp. 43-44.
[21] Ibidem, p. 72.
[22] Ibidem, p. 74.
[23] Idem.
[24] J. Neusner, op. cit., p. 110.
[25] J. Neusner, op. cit., p. 102.
[26] J. Neusner, op. cit., p. 81. Sobre a relação Roma, cristianismo e judaísmo, v. M. Goodman, Roma e Jerusalém. O encontro das civilizações antigas [2007], tr. Ii. Roma-Bari, Laterza, 2009. O Autor sustenta que Roma e Israel teriam podido coexistir sem problema. Todavia, em 66 d.C., sob Nero, os habitantes de Jerusalém haviam se recusado a ir em procissão para cumprimentar duas cortes do imperador, e foi assim que o procurador romano Géssio Foro mandou as suas tropas contra a multidão reunida no mercado superior da Cidade Santa e provocou a morte de 3.600 pessoas. A reação judaica foi fortíssima e levou à constituição de um Estado judaico independente de Roma, que já em 37 a.C. havia ocupado a Judeia. Quando Nero morre em 68, um general de nome Tito Flávio, filho do Imperador Vespasiano, que era naquele tempo o comandante na frente da Judeia, usou de mão de ferro para reprimir a revolta judaica e, depois de um ano de luta, em 70, destruiu Jerusalém e o Templo. Reprimiu também as três insurreições na Cirenaica, no Egito (72), e a de Massada (73). Aqui se inicia a parte mais interessante do livro (pp. 451-583), apesar de não livre de erros e unilateralidade, sobretudo no que diz respeito à origem da disputa entre o cristianismo e o judaísmo (pp. 584-666). Uma vez antes, o Templo de Salomão havia sido destruído, em 586 a.C., por Nabucodonosor da Babilônia, mas em 539 Ciro da Pérsia venceu os babilônios e libertou os judeus, que estavam exilados na Babilônia, e concedeu a eles a reentrada em Jerusalém e a reconstrução do Templo; portanto, em 70 os judeus pensavam que aconteceria algo análogo: um Messias triunfante ou “Novo Ciro”, que expulsaria os romanos e faria reconstruir Jerusalém e o Templo. Muitos piedosos e zelosos ou zelotes israelenses, influenciados pela literatura apocalíptica judaica, imaginavam e profetizavam que o “Novo Ciro” pudesse ser “Nero redivivo” (cf. Giuliano Firpo, A revolta judaica, Roma-Bari, Laterza, 1999). Naquele tempo se formou uma radical hostilidade e um feroz ódio antirromano na Judeia e em Jerusalém, mas Roma não concedeu aos judeus aquilo que usualmente concedia a todos os vencidos de religiões diversas: construir ou reconstruir seus templos. Foi assim que o Templo de Jerusalém não foi mais reconstruído, apesar da triplíce tentativa, que falhou todas as três vezes, do imperador Juliano, o Apóstata. Entre 115 e 116 ocorreu uma quarta insurreição judaica contra Roma, e enfim em 132-135, com o pseudo-messias Bar Kochba, a quinta e última, porque Adriano em 135 arrasou o que restava de Jerusalém e da Judeia, mudando o nome desta última para Síria-Palestina e o de Jerusalém para Aelia Capitolina. Nem os alemães, nem os britânicos, nem os panônios deixaram de ter uma pátria e uma capital para fazer suas rebeliões; só os judeus perderam uma e outra. Um jornalista do Sunday Times(Tom Holland) escreveu que “o século XXI foi forjado da queda, há quase dois mil anos, de Jerusalém” e – acrescentou – da tentativa de restauração de um Estado judeu em 1948, o qual inda não é a possuído pacificamente, mais anuncia uma nova tragédia terrível, que se adensa sobre nossas cabeças, em forma de guerra nuclear [...].
[27] “Bar Kochba tratava o céu com arrogância, pedido a Deus que não se intrometa […]. Bar Kochba destruiu a única proteção de Israel. O resultado era inevitável” (J. Neusner, op. cit., p. 86). Entretanto, deve dizer-se que o atual Estado de Israel foi construído (mas não terminado) pelas mãos do homem e não pela intervenção do Messias.
[28] A leitura apocalíptica judaica compreende os apócrifos proféticos do Velho Testamento (II séc. a.C.–II séc d.C.) e consiste em uma “ficção literária, de soi-disant previsões posteriores aos eventos, que não merecem maior crédito que os oráculos sibilinos” (Francesco Spadafora, Dizionario biblico, Roma, Studium, 3° ed., 1963, p. 41). Ela surge quando Israel atravessa seu período mais tempestuoso, desde a fúria de Alexandre Magno contra o Yahwismo até a destruição de Jerusalém por Tito (70) e Adriano (135). Alguns zelosos Yahwistas sentiram então necessidade de reencorajar os israelenses com duas futuras promessas para Israel, procurando manter viva sua esperança apesar do miserável estado presente. O apocalíptico “é projetado para alimentar o orgulho judaico, abalado pelas evidências, orientando para a aurora futura. [...] Israel será libertado e vingado [...] imperará sobre os gentios dominados e pisados” (Antonino Romeo, entrada “Apocalittica letteratura”, em “Enciclopédia Católica”, vol. I, col. 1616). No futuro, depois da queda do penúltimo Império, que seria Roma, “Israel será liberto e vingado”. [...]. O interesse nacional é estendido à conclusão almejada: Deus de repente entra na luta final entre os gentios e Israel” (A. Romeo, idem, col. 1617); “tudo é restrito ao campo do nacionalismo e do temporal” (Francesco Spadafora, idem). O apocalipse judaico é uma espécie de revelação apresentada como antiga, oculta e esotérica (Francesco Spadafora, p. 42) e, segundo Mons. Antonino Romeo, “resultará em uma espécie de especulação cabalística [...] e de sincretismo gnóstico” (idem, col. 1625). “É repleta de ódio, frequentemente feroz, contra os gentios e de ardente simpatia por Israel”, escreve Marie Joseph Lagrange, (Le judaisme avant Jesus-Christ, 2a. ed., Paris, 1931, pp. 70-90). O apocalipse na sombra da mórbida expectativa da revolução futura, que liberará Israel da Roma pagã-cristã. Ele se deve à formação do mais aceso nacionalismo judaico (Francesco Spadafora), e deste derivará certo gnosticismo e o milenarismo (A. Romeo, idem, col. 1618) com a teoria da mitigaçao das penas e dos danos (cf. a aposcatátase de Orígenes, repetida entre 1940 e 1951 por Hans Urs von Balthasar + 1984 e Jean Daniélou + 1973), cf. B. Allo, Apocalypse, 3a. ed., Paris, 1933, pp. XXVI- XXXIV. Mons. Romeo conclui: “O Reino de Deus se reveste de um caráter nacionalista-terreno. […] O reino será deste mundo. […] mas o Messias é visto como um redentor espiritual, expiador dos pecados do mundo” (idem, col. 1618), e enfim: “Para os gentios o apolicapse é cruel e implacável, e toda a compaixão seria substituída pela fraqueza” (idem, col. 1969).
[29] J. Neusner, op. cit., pp. 118-119. Quanto às relações entre judaísmo talmúdico, islã e cristianismo, cf. Hana Zakarias, Vrai Mohammed et faux Coran, Paris, NEL, 1960; Id., De Moisés à Mohammed, Paris, 1955; J. Bertuel,L’islam: ses véritables origines, Paris, NEL, 1983-84, 3 vols.; B. Lewis, O renascimento islâmico, Bolonha, O Moinho, 1991; S. D. Goitein, Judeus e Arábes na história, Roma, Jouvance, 1980; J. Bouman, O Corão e os judeus, Brescia, Queriniana, 1992; R. Barkai, Chrétiens, musulmans et juifs dans l’Espagne médiévale, Paris, Cerf, 1994; M. Brenner, Breve história dos judeus, Roma, Donzelli, 2009.
[30] Quando se fala do Vaticano II como inaceitável e rejeitável, não se pretende englobar em tal constatação de heterodoxia objetiva a culpa e a punição subjetiva de quem o acolhe de boa-fé, pensando estar obedecendo. Assim como quando se constata a nocividade objetiva do Novus Ordo Missaee a sua abrogalidade não se quer nem minimamente ofender a quem o celebra em boa-fé, de forma reverente e com espírito de obediência, por ignorância inocente de sua carência doutrinal. “Não haja divisão entre nós” (anti-modernistas), mas reestudemos com atenção o “Breve exame crítico do NOM” com a “Carta de apresentação” dos Cardeais Antonio Bacci e Alfredo Ottaviani, onde se podem ler severas considerações sobre sua não ortodoxia objetiva e onde se pede que seja ab-rogado por nocivo. Não nos deixemos distrair pela polêmica que surgiu quando se considerou ab-rogado o Vetus Ordo, por um abuso de poder [...]. Então (1976) foram ditas palavras fortes, mas pronunciadas no curso de homilias, sem possibilidade de se fazerem todas as devidas distinções. Não me parece correto culpar a Mons. Marcel Lefebvre por alguma frase extrapolada em seus sermões, e ver na Fraternidade São Pio X o “mal absoluto”, assim como me parece pueril a pretensão de alguns, por sorte poucos, “tradicionalistas” de transformar a Fraternidade na Igreja de Cristo. Também neste caso a sã lógica condena o sofisma ex uno disce multis.
[31] Op. cit., p. 9.
[32] Idem.
[33] Idem.
[34] Ibidem, p. 32.
DON CURZIO NITOGLIA
[Tradução: Gederson Falcometa]
6 de fevereiro de 2010